quarta-feira, 24 de março de 2010

LEI 11.645, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1996. OBRIGATORIEDADE DA TEMÁTICA”HISTÓRIA E CULTURA “AFRO-BRASILEIRA E INDÍGENA”.

“A lei 11.645 estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática: “História e Cultura Afro- Brasileira e Indígena. “

Mas o que é cultura?  O significado mais comum diz respeito às informações e ao conhecimento que uma pessoa tem sobre diversas áreas da literatura, pintura, coisas ligadas à criação artística, à filosofia, ao saber de forma geral.
  Sendo assim, essa lei vem ao encontro da necessidade de se resgatar e de se manter as culturas africanas e indígenas, protegidas da ação do tempo e das sociedades, levando o conhecimento dessas etnias aos alunos em sala de aula.
 É inegável a colaboração e a herança cultural deixada pelos negros, índios e seus descendentes. Somos hoje o produto desta miscigenação.
 Mas é importante ressaltar que, embora sejamos produto de diferentes etnias, vigora em nossa cultura o preconceito e a discriminação, encravados na sociedade brasileira  desde os primórdios do descobrimento.   

(...) “Oh! Quem foi das entranhas das águas,
O marinho arcabouço arrancar?
Nossas terras demandam, fareja...
Esse monstro... o que vem cá  buscar?(...)
                  
Vem trazer-vos algemas pesadas,
Com que tribo tupi vai gemer;
Hão de os velhos servirem de escravos,
Mesmo Piaga inda escravo há de ser. [1]
                     

      Num país de paisagens belíssimas, exóticas, o que chamou mais a atenção dos navegantes que aqui chegaram foram com certeza  os seres que andavam seminus, falando palavras incompreensíveis,  portando armas feitas de madeira, descalços e usando enfeites pelo corpo.

 Índios de várias tribos, os verdadeiros donos desta terra.
  A estes foram impostos o subjugo e muitas dessas tribos acabaram por ser dizimadas ou tiveram suas culturas violentadas pela intolerância europeia. 
     Havia no país por volta do descobrimento  cerda de 450 mil [2]  índios divididos em várias tribos, distribuídas por  todo o litoral brasileiro.

 “O Brasil nasceu à sombra da cruz. A colonização das almas indígenas, não se deu apenas porque o nativo era potencial força de trabalho a ser explorada, mas, também, porque os índios não tinham “conhecimento” do seu Criador e as coisas do Céu.” [3]

  No princípio da colonização, os europeus chegaram a afirmar que os índios não eram seres humanos, não possuíam alma ou inteligência, reforçando suas teses com partes citadas da Bíblia. Contudo, o Papa Paulo III, por motivações políticas, devido à perda de fiéis para o movimento da Reforma Protestante na Europa, afirma, na bula Universis Christi Fidelibus, de 1536, que os indígenas eram sim verdadeiramente homens e assim sendo, constituíam seres racionais e aptos a serem convertidos ao catolicismo (os negros não foram de igual modo tratado, a estes o Papa não resguardou a condição de seres humanos, e assim se construiu o mito da coisificação do negro). Isso foi fundamental para dar uma característica de missão à presença de homens da Igreja na América.
  Os primeiros religiosos a desembarcarem entre nós foram oito franciscanos, membros de importante ordem estabelecida há tempos em Portugal. Sua presença como capelães de bordo na navegação portuguesa era comum, mas não tinham prática na colonização dos gentios.
 Assim, chega ao Brasil, em 1549, o primeiro grupo composto de seis missionários da recém fundada Companhia de Jesus, lideradas por Manoel da Nóbrega. Sua primeira providência foi organizar uma escola, onde os índios, juntamente com órfãos portugueses, moços perdidos, ladrões e maus eram doutrinados. Muitos deles teriam um papel relevante, embora anônimo, nos projetos da Companhia. Cabia-lhes aprender o tupi-guarani, tendo como tarefa a conversão de crianças nativas.
 A Igreja ( não só o catolicismo, como também protestantes e judeus)  muito colaborou para a perda da identidade cultural das culturas indígenas e africanas.
Tentou de forma didática e, muitas vezes, opressora, modificar os hábitos do cotidiano, na alimentação, no vestir, nos cultos, na língua e até mesmo os jogos e  nas brincadeiras infantis. Tudo tinha função cristianizadora.
 Com isso, o índio perdeu muito de sua genuína formação cultural. Poucos nos dias de hoje ainda resistem, tentando manter uma tradição, que vem sendo por séculos violados pela intolerância humana.
      Com os africanos não foi muito diferente.
A chegada de navios negreiros ao Brasil, por volta do século XVI, trouxe não somente uma mão de obra necessária para se movimentar a economia da colônia, mas também um novo elo na formação cultural do mesmo.
      Chegaram aqui em navios, amontoados como cargas. Foram sequestrados de suas tribos, de suas famílias e trazidos para uma terra desconhecida.
      O poeta dos escravos, Castro Alves, retrata com primazia o horror e a covardia desse ato em seu conhecido poema O Navio Negreiro:
       
“Existe um povo que a bandeira empresta
Pra cobrir tanta infâmia e covardia!...
E deixa-a transformar-se nessa festa
Em manto impuro de bacante fria!...
  
    Os escravos que chegavam ao Brasil eram embarcados em alguns portos africanos, como Luanda, Benguela e Cabinda, na costa de Angola; Ajudá e Lagos na Costa de Mina, e, mais tarde, do porto de Moçambique.
              
“Era um sonho dantesco... o tombadilho
Que das luzernas avermelha o brilho
Em sangue a se banhar.
Tinir de ferros... , estalar de açoites...
Legiões de homens negros como a noite
Horrendos a dançar...” [4]

 Depois dos horrores vividos na travessia do Atlântico, amontoados em porões imundos, comendo e bebendo o mínimo necessário à sobrevivência, vendo companheiros de viagem morrer em razão de doenças e maus–tratos, os africanos eram levados a galpões e mercados nos quais eram expostos à venda.
       Antes, porém, eram tratados de suas doenças, recebiam comida  para que tivessem uma melhor aparência. [5]
   Em Macaé, (Estado do Rio de Janeiro, Brasil) alguns trabalhos estão sendo colocados, na busca da recuperação da cultura africana, vale à pena ressaltar entre outros, o trabalho sério e dedicado do mestre Dengo na Associação de Capoeira Raízes de Aruanda, projeto ginga educativa. Atuando em comunidades carentes, ele já formou discípulos no ensino da capoeira.
A capoeira não deve ser considerada simplesmente como um jogo ou dança, ela é muito mais. A inclusão ultrapassa os limites do resgate da auto-estima ou da história de um povo, alcança a interdisciplinaridade. Pessoas, através da capoeira,  vencem seus limites  e suas deficiências físicas.
                Mestre Dengo atua no resgate da vida.
Trazendo para sala de aula a verdadeira História da colonização do Brasil, desconstruiremos toda essa falsa imagem criada em torno dos índios e negros.
          Mostrando suas culturas e de como elas estão misturadas aos nossos hábitos do dia a dia, estaremos mostrando o quanto somos mestiços no comportamento e assim sanando um pouco da dívida que temos com esses povos.
Seja no físico, na culinária, na religião, na língua, nas artes, na moda, o povo brasileiro tem seus traços marcados pelas etnias que compuseram sua formação e temos que ensinar as futuras gerações a conviverem, aceitarem e resgatarem isso com muito orgulho. .

  1. DIAS, Antonio Gonçalves - O Canto do Piaga.
  2. BUENO, Eduardo - Brasil, uma História; A incrível saga de um país. cap. 1. pág. 19.
  3. DEL PRIORE, Mary - O Livro de Ouro da História do Brasil. Cap. 3 . Pág. 36.
  4. ALVES, Antônio Castro - O Navio Negreiro.
  5. SOUZA, Marina de Mello - África e Brasil Africano.
 Ivana Matos Pinheiro Tavares
Graduando em História
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Macaé

Um comentário:

Unknown disse...

Parabéns Ivana, será que ja estou vendo o nascimento de uma historiadora ? Com certeza..
Você faz parte do time dos amantes de HISTORIA e com seu texto primoroso nos leva a reflexão do tratamento que temos dado aos negros e indigenas do nosso pais.
abraços
GUARA